A terapia celular tem se apresentando como uma alternativa promissora para tratamento de lesões esportivas. Atletas nos EUA, Canadá e Europa já recorrem ao procedimento em busca de alívio para dores, regeneração muscular, de cartilagem e ósseas. Aqui no Brasil, o jogador Rodrigo Dourado, na época jogando pelo Internacional, também optou pela técnica à base de células-tronco para acelerar a cicatrização de um edema ósseo no joelho esquerdo. Segundo o ortopedista, cirurgião de coluna e especialista no tratamento das dores com células-tronco, Luiz Felipe Carvalho, que esteve à frente dos cuidados com o jogador e realizou as infusões, o tratamento de Dourado consistiu na retirada de células-tronco do tutano do osso da bacia – Concentrado do Aspirado de Medula Óssea (BMAC, sigla em inglês para Bone Marrow Aspirated Concentrated) – que foram injetadas no edema para acelerar a recuperação da lesão.
Nesta entrevista, concedida com exclusividade para o Blog da R-Crio, o especialista explica mais sobre a medicina regenerativa voltada ao esporte, para a ortopedia e ao tratamento da dor. Além disso, salienta como as terapias celulares podem, além de propiciar longevidade, devolver a qualidade de vida às pessoas.
1. Doutor, conte um pouco sobre a sua formação e carreira.
Sou médico ortopedista, cirurgião de coluna e especialista em medicina regenerativa para tratamento da dor com o uso de células-tronco. Fiz três anos de residência médica em ortopedia. Depois, um ano de residência médica com especialização em cirurgia da coluna vertebral. Me dediquei a mais cinco anos de especialização em medicina regenerativa entre o Brasil, os Estados Unidos e a Europa. Hoje, atuo na cirurgia da coluna vertebral, na recuperação das articulações com o uso das células-tronco e no tratamento das dores crônicas também com o uso da células-tronco. É um procedimento inovador. Aqui no Brasil é uma opção ainda recente, mas muito eficaz
2. Quando se interessou por pesquisas com células-tronco?
Me interessei por pesquisas com células-tronco quando fui buscar sobre o tema já que sempre tive uma inquietude. No meu consultório havia apenas duas opções: tratamento conservador com fisioterapia ou cirurgia. Então, percebi que existia uma disparidade. Era uma lacuna entre o tratamento de fisioterapia e o cirúrgico. Alguns pacientes faziam muita fisioterapia e eu sabia que a cirurgia não era a melhor opção; outros pacientes, que eram propriamente cirúrgicos, eu via que o procedimento não ajudaria tanto. Então, fui em busca de alternativas que preenchessem essa lacuna. Encontrei a medicina regenerativa e o tratamento com células-tronco.
3. Quais são as causas dos desgastes articulares? Genética? Movimentos repetitivos ou ação da idade?
O desgaste articular é uma patologia multifatorial. O que é isso? Existe um fator genético, por exemplo, como a artrose do joelho. O fator genético está muito presente; a idade também, porque simplesmente não é apenas o cabelo que fica branco. Desgastamos as nossas articulações e, muitas vezes, a matemática da vida não fecha. Quando a gente ganha mais idade precisaria, em teoria, ter mais músculos exatamente onde temos menos. Isso acontece em função da baixa hormonal. E, por isso, o músculo é consumido. É exatamente o que fará a diferença na terceira idade: a qualidade muscular e a quantidade de exercício físico que foi feita até então para a manutenção. Diante disso, as dores nas articulações começam por conta da perda da qualidade e quantidade de músculos, ou seja, força e massa. Isso acontece quando ficamos mais velhos.
4. Especificamente para atletas de alto rendimento, quais são as alternativas tradicionais de tratamento disponíveis hoje para a perda da cartilagem articular nos joelhos, por exemplo?
A artrose está ligada à quantidade de impacto que a articulação sofreu durante a vida. Por exemplo, corredores, atletas de futebol, de basquete, de vôlei têm mais impactos. Esses impactos causam microlesões diariamente, ou seja, desgastam a cartilagem. Então, a atividade, a associação entre o fator intrínseco genético – o que não se pode mudar – associado ao fator extrínseco – a carga, o excesso de peso, a baixa musculatura, o estresse articular, entre outros – pode levar para o desenvolvimento rápido da artrose em idade precoce. Para os atletas profissionais, a ortopedia tradicional tem pouquíssimas técnicas eficazes para as lesões de cartilagem. Dependendo da área, sabemos que, muitas vezes, com o impacto haverá um edema ósseo e que vai piorar. Então, a medicina e a ortopedia tradicionais ainda estão em busca de alternativas. Claro, tem membranas de cartilagem que são usadas. Existem opções, porém, com grande efetividade ainda não há.
5. Com a chegada da terapia celular o que muda?
Com a terapia celular o médico tem uma nova alternativa para tratar seus pacientes da lesão de cartilagem, da dor crônica, da lesão muscular. Como? Fazemos o implante de células-tronco, a infusão de uma fração da medula óssea exatamente no local da lesão, quando falta tecido cartilaginoso, tem tecido com edema ósseo ou uma necrose óssea. Os trabalhos hoje já estão perfeitamente difundidos e a medicina regenerativa bem fundamentada. A terapia celular, no mundo, tem 40 anos, com evidências científicas bem embasada para o uso das células-tronco nas afecções ósseo-musculares.
6. Na medicina do esporte, quais os estudos desenvolvidos em que as células-tronco mesenquimais entram como alternativa de tratamento para lesões esportivas?
Os estudos estão direcionados para lesão de cartilagem do joelho. Nesse tipo de lesão, temos um grau de residência nível 1, ou seja, com evidência maior, como por exemplo a reconstrução do ligamento cruzado anterior, algo que a ortopedia faz há muitos anos. A lesão de cartilagem tratada com células-tronco tem evidência 1 e a lesão do ligamento cruzado tem evidência 2. Então, existe um paradoxo. Um tratamento que é tido muitas vezes como experimental, de evidência 1, e o outro tratamento, visto como tradicional, tem evidência 2. Muitas vezes, a medicina no Brasil tem esses paradoxos.
7. No tratamento oferecido ao jogador Rodrigo Dourado, do Internacional, foram utilizadas células do tutano do osso da bacia para promover a recuperação de uma área lesionada. Como é realizado o procedimento?
Foram utilizadas células-tronco do tutano do osso da bacia, ou seja, uma fração da medula óssea injetada exatamente no local em que ele tinha um edema ósseo. Como a gente fez? Coletamos o tutano do osso, que passa por um processo e se transforma em Concentrado do Aspirado de Medula Óssea (BMAC). O ultrassom direciona exatamente o local da lesão e injeta. Essas células vão fazer com que o osso se recupere. A recuperação acontece por meio de uma célula primária que formará um novo tecido ósseo.
8. Como vê a aceitação da medicina regenerativa no Brasil?
Acredito que seja apenas uma questão de tempo para a medicina regenerativa, a viscossuplementação, o ozônio, a célula-tronco mesenquimal e os padrões de medicina do sono serem totalmente aceitos no mercado brasileiro. Contra fatos não há argumentos. Os trabalhos já demonstram total razão e total segurança.
9. Qual o seu ponto de vista sobre a medicina regenerativas?
É a medicina do presente. Muitos ainda falam que é algo para o futuro mas não é! Estamos vivendo-a! Comecei a estudar em 2015, iniciei a aplicação no meu dia a dia no mesmo ano. Antes de virar ciência, alguém fez primeiro. A medicina regenerativa tem evidências científicas nível 1.
10. Como você vê as tratamentos com células-tronco disponíveis hoje e quais são os benefícios para quem precisa do tratamento?
Vou falar na minha especialidade, que é a ortopedia e lesões esportivas. É bastante incentivador, tenho muitos casos em que consegui melhorar a qualidade de vida do paciente usando as células-tronco no tratamento de doenças crônicas. Em pessoas com 20, 30 anos de dor, que não tinham mais esperança, a terapia celular resolveu o problema. Isso se resume em: quantidade de vidas que conseguimos impactar com o tratamento.