A fissura labiopalatina é a malformação craniofacial mais comum presente no nascimento. No Brasil, dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que aproximadamente 1 a cada 650 crianças nasce com a condição. Atualmente, o diagnóstico precoce acontece por ultrassom no final do primeiro trimestre da gestação. A patologia ocorre pela não fusão dos processos da face. Dessa forma, o bebê tem o lábio aberto e, muitas vezes, o palato (céu da boca) também.
O procedimento considerado padrão ouro no mundo para o tratamento consiste na retirada de um pedaço grande do osso ilíaco (bacia) para fechar o osso alveolar. A cirurgia permite a erupção dos dentes e várias outras funções importantes.
O que diz a especialista
Segundo a cirurgiã-dentista, pesquisadora e geneticista Daniela Bueno, o tratamento é delicado e as intervenções cirúrgicas são realizadas em três fases para que a fissura labiopalatina seja fechada. No entanto, usar células-tronco mesenquimal da polpa do dente de leite dispensa a extração de uma parte do osso da bacia.
A profissional lidera um estudo clínico pioneiro que explora o potencial terapêutico das células-tronco do dente de leite para tratar as fissuras labiopalatinas em crianças. O projeto tem quase 20 anos de vida e já realizou no país 65 procedimentos bem-sucedidos.
Projeto PROADIS/SUS
“O projeto PROADIS/SUS (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde) envolve tecnologia desenvolvida no Brasil e permite que, na fase em que a criança portadora de fissura labiopalatina necessita fazer o enxerto ósseo alveolar, em vez de utilizar o osso autógeno (que é o osso da bacia do paciente), entram em cena as células-tronco do dente de leite da própria criança, associadas a um biomaterial. Dessa combinação, é feito o osso para a criança”, explica a pesquisadora.
Segundo Daniela Bueno, o dente de leite é uma fonte não invasiva de células-tronco mesenquimais a ser utilizada. As chances de rejeição, por exemplo, são praticamente nulas. “O procedimento tem um impacto muito grande na vida da criança. Dessa forma, evita dor, uso de grande quantidade de medicamentos no pós-operatório e diminui drasticamente o tempo de hospitalização. Com esse tratamento, o paciente volta para casa no mesmo dia em que fez a cirurgia”, complementa.
O trabalho pelo Brasil
O projeto avança pelo Brasil a fim de beneficiar grande número de crianças. Centros de referência de Joinville como o Núcleo de Pesquisa e Reabilitação de Fissuras Lábio Palatais – Centrinho Prefeito Luiz Gomes, Hospital Infantil Dr. Jeser Amarante Faria e Hospital Regional Hans Dieter Schmidt
A coleta e preparo do material para a terapia está sob responsabilidade do centro pioneiro do país na técnica de isolamento, expansão e armazenamento de células-tronco do dente, gordura (tecido adiposo) e do céu da boca (periósteo do palato), a R-Crio. O laboratório tem a frente o cientista José Ricardo Muniz Ferreira, que estudou a fundo e aprimorou a técnica de extração, armazenamento e cultivo de células-tronco. Além disso, a R-Crio atua em diversas frentes no Brasil e no exterior, voltadas para o desenvolvimento da saúde para impactar positivamente a vida das pessoas e contribuir para a evolução da medicina regenerativa a partir das células-tronco.
Longevidade com qualidade de vida
“Sempre tivemos como foco fazer contribuições significativas e de vanguarda em saúde para que a longevidade com qualidade vida. Que esteja, efetivamente, ao alcance da ciência, da clínica e da sociedade. Essa proposta, aumenta a possibilidade de crianças e adultos terem medicamento biológico em condições de uso e quantidade suficiente para atender ao tratamento das principais condições. Como é o caso da fissura labiopalatina, bem como de doenças agudo-degenerativas. Sempre respeitando às condições regulatórias para o uso”, enfatiza Muniz Ferreira.
O estudo para o fechamento da fissura labiopalatina com células-tronco do dente de leite tem o potencial de estabelecer um novo padrão de cuidado para as crianças. Dessa forma, minimiza a dor e melhora os resultados estéticos e funcionais. Além disso, oferece uma abordagem mais compreensiva ao tratamento, levando em consideração as necessidades psicossociais dessas crianças, muitas vezes marginalizadas devido à sua condição. “Melhorar a qualidade de vida das crianças afetadas é o nosso objetivo. Simultaneamente, ser um modelo para futuras pesquisas em terapia regenerativa”, finaliza a pesquisadora Daniela Bueno.