A lesão medular é caracterizada pelo trauma na estrutura neurológica do canal medular, localizado na coluna vertebral. Como resultado da lesão, as pessoas desenvolvem limitações motoras e sensoriais e, como consequência, patologias secundárias como diabetes, sedentarismo, quadro de osteoporose e doenças cardiovasculares em decorrência da falta de movimento. A lesão na coluna é irreversível, e ainda há poucas terapias para melhorar a qualidade de vida dos pacientes. O tratamento com células-tronco para lesão na coluna é uma das esperanças de médicos e pacientes.
Como acontece a lesão na coluna?
Acidentes de carro, quedas e lesões por arma de fogo estão entre as principais causas das lesões medulares. Em 2013 a Revista Exame divulgou números da OMS, relatando que cerca de 500 mil pessoas sofrem esse tipo de lesão no mundo todos os anos. Os pacientes são submetidos à intensas terapias e muitas vezes apresentam melhoras, apesar de, em grande parte dos casos, elas não serem tão significativas.
Células-tronco para tratar a lesão na coluna.
Células-tronco são muito conhecidas por sua capacidade de gerar novas células, sendo usadas em tratamentos regenerativos. Entretanto, elas também possuem uma outra capacidade extremamente promissora para o uso terapêutico. Células-tronco possuem a capacidade imunomoduladora, ou seja, são capazes de controlar a resposta inflamatória do organismo. Falamos disso em diversos outros textos, veja esse aqui.
Essa característica foi estudada pelo pesquisador Michael Fehlings. A proposta dele era estudar a efetividade das células-tronco em lesões de coluna, mas testando também a fonte da coleta das células-tronco. O pesquisador utilizou ratos para fazer os testes, e injetou as células-tronco em três grupos: o primeiro recebeu células-tronco mesenquimais do tecido do cordão umbilical de bebês no primeiro trimestre de gestação, o segundo grupo recebeu também do tecido do cordão, mas do final de gestação, e o terceiro grupo recebeu células-tronco da medula óssea. O quarto grupo não recebeu nada para finalidade de controle dos resultados. As células foram injetadas após 1h da lesão.
Os resultados
O pesquisador descobriu que todas as células-tronco apresentaram melhoras, reduzindo a permeabilidade vascular e o volume da lesão. Elas também foram associadas a melhoras na formação de cicatrizes. A análise desses resultados positivos também mostrou que as células-tronco da medula óssea e do tecido do cordão umbilical do primeiro trimestre de gestação apresentaram melhores resultados na densidade vascular e preservação do tecido nervoso.
A pesquisa também reparou que as células-tronco mesenquimais do cordão umbilical no primeiro trimestre de gestação foram associadas à efeitos duradouros na função o membro dianteiro e no ganho de peso. De acordo com o pesquisador, essa melhora foi uma evidência de que a idade do tecido doador de células-tronco tem uma influência importante sobre os efeitos terapêuticos da terapia celular.
Stemirac: Terapia Celular Aprovada para Lesão Espinhal
Já falamos em outro texto sobre as terapias celulares avançadas aprovadas ao redor do mundo. Entre elas, podemos citar o Stemirac, aprovado no Japão em 2018 para tratar lesões na coluna. Ele foi desenvolvido pela Universidade de Medicina Sapporo, em conjunto com a empresa Nipro, e consiste no uso de células-tronco mesenquimais da medula óssea do próprio paciente. Nesse link você pode ver a publicação original em inglês, diretamente no site do PMDA (Pharmaceuticals and Medical Devices Agency), órgão responsável pela aprovação no Japão (como a Anvisa brasileira).
Ele é indicado para pacientes que sofreram a lesão até duas semanas antes do início do tratamento. As células-tronco são extraídas do paciente e cultivadas até chegarem entre 50 milhões e 200 milhões, e depois são injetadas no sistema circulatório. De acordo com os pesquisadores, as células reduzem a inflamação, liberam substâncias que promovem a regeneração e podem até se diferenciar em células nervosas.
A polêmica do tratamento
Apesar do tratamento parecer mesmo um “milagre”, muitos cientistas são céticos quanto à eficiência do tratamento, pois podem haver problemas no desenho do estudo e do mecanismo que levou à aprovação da terapia celular avançada.
O ensaio clínico que levou à aprovação da terapia foi considerado pequeno, pois só foi realizado com 13 participantes, levando em conta que não é uma condição rara de saúde (como vimos no início desse texto). Além disso, o estudo não tinha um grupo controle, como os ratinhos do estudo do doutor Fehlings. O grupo controle é um parâmetro muito usado para comparar a segurança e, principalmente, a eficácia da substância que está sendo utilizada.
Depois de seis meses do tratamento, 12 dos 13 voluntários do estudo apresentaram melhoras no movimento e sensibilidade, porém esse resultado não convenceu muitos cientistas. Os voluntários também tinham sido submetidos à sessões de fisioterapia e, além disso, também existe um período de recuperação natural dos processos fisiológicos sem a intervenção das células-tronco. Justamente por isso um grupo controle era importante para comprovar os resultados.
Revista Nature contesta a decisão
A prestigiada Revista Nature publicou um editorial apontando os problemas. Dos 10 especialistas contatados pela revista, nenhum foi favorável a comercialização e aprovação do tratamento. Paul Knoepfler, nomeado uma das 50 pessoas mais influentes no campo de células-tronco, considera essa a aprovação mais controversa de um tratamento com células-tronco até o momento e um passo atrás para a medicina regenerativa.
Casos da mídia
Apesar das controvérsias, o tratamento continua aprovado no Japão. Nós não temos informações sobre resultados e pacientes que foram beneficiados pelo tratamento. Mesmo assim, sabemos de dois casos relatados por grandes universidades sobre o uso de células-tronco para lesões na coluna.
Garoto de 21 anos ganha novamente os movimentos dos braços em tratamento experimental com células-tronco.
Em 2016 foi publicada a matéria pelo site da University of Southern California (USC), relatando que o doutor Charles Liu, diretor do Centro de Restauração Neurológica da universidade, injetou células-tronco diretamente na medula de Kristopher Boesen, jovem de 21 anos que sofreu uma lesão na medula cervical após um acidente de carro.
De acordo com a universidade, duas semanas depois da infusão já haviam sinais de melhora. Três meses depois, o Kris estava se alimentando sozinho e usando o celular, escrevendo seu próprio nome e operando a cadeira de rodas sozinho.
A universidade finaliza dizendo que está conduzindo novos ensaios clínicos para avaliar a eficácia do tratamento. Eles indicam que, em 2018, já com o ensaio clínico realizado, em parceria com a Asterias Biotherapeutics, que 100% dos pacientes que foram submetidos à terapia celular com 20 milhões de células recuperaram até 1 nível de função motora (como retomar a habilidade de usar os braços). Você pode ver a publicação original em inglês aqui.
Cientistas da Universidade de Yale reparam lesão na medula espinhal usando células-tronco do próprio paciente.
Agora em 2021, pesquisadores da universidade de Yale reportaram no Journal of Clinical Neurology and Neurosurgery melhoras significativas em um paciente que foi submetido a uma terapia celular para lesão na coluna. De acordo com a matéria (aqui), mais da metade dos pacientes apresentaram melhoras substanciais nas funções motoras após algumas semanas da infusão de células-tronco, como habilidade de caminhar ou usar as mãos. Nenhum efeito colateral foi observado.
O pesquisador responsável se diz otimista quanto ao resultado, mas que são necessários mais ensaios clínicos para confirmar a segurança e eficácia do tratamento. O estudo foi feito em parceria com pesquisadores da Sapporo Medical University (aquela do Stemirac), os quais também trabalham na Universidade de Yale.
Armazene células-tronco
Incrível, né? As terapias celulares são capazes de coisas incríveis, mas a responsabilidade em encontrar a melhor forma de uso também é um assunto para ser discutido. Mesmo assim, os resultados preliminares iluminam o caminho de pesquisadores do mundo inteiro que podem começar a desenvolver estudos paralelos para encontrar novas abordagens.
Por isso somos entusiastas do armazenamento de células-tronco, e recomendamos fortemente que você e sua família tenha suas células-tronco armazenadas o quanto antes. Vimos nessa matéria da influência da idade da célula armazenada e seu potencial terapêutico, além de que as quantidades de células-tronco para serem usadas na terapia celular são muito grandes.
Dessa forma, reforçamos que você armazene como uma forma de prevenção, já mantendo suas células-tronco jovens e multiplicadas em grandes quantidades para usar se necessário. E olha só: não são só para tratamentos de doenças e condições complexas que as células-tronco podem ajudar!
Entenda sobre isso e muito mais em outros textos de nosso blog, e se encante ainda mais com as possibilidades da medicina regenerativa.